03/05/2025, 0:00 h
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Cultura Opinião Abílio Travessas
CULTURA
Por Abílio Travessas (Colunista e Professor aposentado)
Deu em livro a “vida (a)venturosa” do padre José Martins Júnior. Raquel Varela, historiadora de títulos vários – Breve História de Portugal, História do Povo na Revolução Portuguesa, entre outros – consegue revelar-nos um padre “implicado” na defesa dos mais pobres, dos mais deserdados, “condenados da terra”, onde exerceu o ofício de sacerdote.
O melro, eu conheci-o: Era negro, vibrante, luzidio, Guerra Junqueiro, A Velhice do Padre Eterno, longo hino à liberdade, serve de abertura aos capítulos do livro. A vida do padre, nascido na década de trinta, acompanha a história dos anos negros do nosso fascismo estadonovista, salazarista, na Madeira, no Porto Santo para onde o quiseram desterrar por já dar sinais de não ler pela cartilha do catolicismo normativo dos poderosos. Escolhido para ler a oração de sapiência em cerimónia laudatória do 1ºde Dezembro restaurador – “tinha sido o aluno mais brilhante do seu curso. – Os maiores criminosos, disse Martins do histórico púlpito da catedral, evocando a narrativa Samaritana, não estão nas cadeias. Jesus não precisa de adoradores que venham ajoelhar-se em fofas almofadas vermelhas”, marcou-lhe o devir em Porto Santo, à altura um deserto. Aí fez obra e só saiu contra a vontade duma gente abandonada, insularidade maior do que a da Madeira.
Ribeira Seca (depois de passar pelo norte de Moçambique, capitão-capelão, testemunha dum colonialismo aberrante em guerra – a tortura e morte de guerrilheiro, orelhas cortadas para o fazerem confessar: “O homem desfaleceu, caindo sem forças, desmaiando sobre o próprio sangue. Não consegui suportar mais e coloquei-me à frente do capitão. – É de mais! Dê-lhe um tiro, para o homem não sofrer mais. E foi o que aconteceu) a freguesia mais pobre de Machico, foi o desterro seguinte. Aqui, contra a colonia, sistema de exploração da terra, teve no padre Martins o grande lutador, ao lado dos mais pobres dos pobres. “Fomos a uma das casas. Uma única divisão, de pedra. Dentro, ao canto, uma mesa, junto à cama uma seira com carne de porco salgada, por baixo da cama um cesto de vime com semilhas e batatas, e aos pés as ferramentas agrícolas. Dormem aqui pai, mãe e os seis filhos – disse-me o padre Martins”.
- Até aqui, (ao 25 de Abril) se fizéssemos uma casa de banho, ou um quartinho, o senhorio dizia-nos que estávamos a “abusar” - disse o caseiro.
Até 1974 subsistiu este sistema feudal de colónia. Caso único em toda a Europa. Um atraso profundo.
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