28/12/2025, 0:00 h
7
Opinião António Colaço Direito
OPINIÃO
Por António Bernardo Colaço (Juiz Conselheiro STJ Jubilado)
A) Perdoem-me esta forma pouco protocolar de iniciar uma intervenção: Eu pergunto: Já alguém, na assistência com > 65 anos, * foi vítima de um gesto agressivo contra a sua pessoa? ou * foi abandonado num hospital? ou *foi despejado sem saber depois para onde ir? ou * foi objeto de comentário à sua aparência de idade? ou * viu ser-lhe recusado um lugar para se sentar ou ter a prioridade numa fila? ou * sentiu a insinuação de que era um encargo familiar, ou, * de que o seu lugar era numa casa de idoso?
Silencie a resposta, mas que todos tenham a noção de que está aqui em causa a violência contra a terceira idade. A sociedade fez-nos ganhar a longevidade. No entanto, segundo dados da ONU 1 em cada 6 pessoas idosas com mais de 60 anos terá já sofrido uma qualquer violência, seja física ou psíquica. Em Portugal, entre janeiro e agosto de 2025, a APAV (Associação Portuguesa de Apoio à Vítima) apoiou 1557 p.i., entre 65 e 74 anos vítimas de crime, estando a violência doméstica orçada em 81%. Já este mês, a GNR, entregou à Segurança Social 4 idosas vítimas de violência física num lar de idosos de Oiã e a PSP assegurou que no 1º trimestre deste ano, 80% de casos de violência doméstica era de filhos contra os pais.
B) A longevidade, sendo um benefício, acaba por ser, assim uma preferência para a ação violenta num mundo onde, a par de instabilidade social gerada pela política neoliberal, campeiam tendências marcadas pelo individualismo, ambição e egoísmo. São traços que afetam pela negativa, os laços de solidariedade que é suposto existir no seio da família. Não é em vão que a violência doméstica, figura entre os formatos mais em evidência.
O problema de violência contra pessoa idosa não é novo. Ela sempre existiu. Sucede apenas que faltou a sua divulgação, por indiferença, por vergonha, por receio ou por incapacidade. Inicialmente encarado como um reflexo de índole social, assumiu relevo individualizado com a Declaração Universal dos Direitos do Homem (1948). Em 2006, a ONU ao declarar o dia 15 junho como o Dia Mundial de Consciencialização de Violência contra a Pessoa Idosa, reforçou a ideia de que esta tipo de violência atenta contra um Direito Humano – o direito da pessoa idosa do pensionista e do reformado, a envelhecer com dignidade e respeito.
C) Mas afinal, em que é que se traduz este tipo de violência? Segundo estudos esta pode assumir diversos formatos: - violência física; - violência psicológica; - violência sexual; - violência económico-financeira; - negligência e, - abandono. Importa destacar que uma fatia substancial desta violência é atribuída à família nuclear. Um estudo, que foi coordenado pelo Instituto Ricardo Jorge, demostrou que, a partir dos 76 anos o risco de ser vítima de violência aumenta em 10% por cada ano de idade. As consequências desta violência podem ser as mais variadas; desde sentimentos de medo, tristeza, raiva, solidão e humilhação, sentimentos estes geradores de depressão, isolamento perda de autonomia e mortalidade.

E é neste ponto, que tomo a liberdade de me reportar às respostas que os presentes nesta sala, terão dado às perguntas que formulei no início desta intervenção. E mesmo àqueles que tiveram a sorte de não serem violentados, convido-os a interiorizar este sentimento, por uma questão de solidariedade, pugnando para que o lema deste Congresso se traduza numa verdadeira manifestação pela dignidade, participação e qualidade de vida da pessoa idosa.
D) O artigo 72º da Constituição reconhece os direitos da pessoa idosa, no tocante à sua autonomia pessoal, ao suprimento do seu isolamento e da marginalização social. Mas …., uma coisa é o reconhecimento de direitos, outra, são as vias ativas para os tornar práticos.
A este respeito há que distinguir entre a violência participada e a não participada. Para a 1ª temos a via jurídico/ institucional. O artigo 152º- A do Código Penal (pune quem infligir maus-tratos a pessoa que tenha a seu cuidado e que seja particularmente indefesa). Temos ainda a APAV, enquanto organismo, de índole particular, que presta apoio a vítimas de crimes e violência. Porém, a sua intervenção só ocorre havendo uma participação direta aos serviços competentes.
Atenção particular merece, por isso, a 2ª modalidade onde os casos da violência (pública, privada ou social) é do domínio público, mas não é participada. É a violência silenciada, que, se pressente, que a vizinhança sabe, pelo barulho, num olhar de tristeza ou num suspiro de lamento. Alguns exemplos: o isolamento; o tratamento depreciativo ao nível familiar; o desprezo, o tratamento abusivo nas casas de repouso; o abandono ou casos de violência doméstica.
E) Qual a solução? 1) a) A Administração Pública, a começar pelo Governo tem um papel determinante nessa matéria, através de uma * legislação criminal e de medidas preventivas mais especificadas; *equipas de fiscalização programada das casas de repouso, de idosos e outras instituições congéneres, * por uma edução escolar e cívica; * cartazes publicitários; *por uma rede de cuidadores profissionalizados; implementação de um policiamento de proximidade efetivo ao nível nacional e * a aprovação de um Estatuto de Pessoa Idosa. b) As Câmaras Municipais, são chamadas a exercer a sua responsabilidade face à comunidade, devendo dispor de *um departamento específico para o efeito; * agilizando a sua polícia municipal; * criar um registo de pessoas em perigo; * formar equipas de fiscalização com o patrocínio das Juntas de Freguesia e * monitorização domiciliária. c) No plano comunitário é fundamental estabelecer uma conectividade social, desenvolvendo um sentido de solidariedade e de vizinhança responsável, designadamente na denúncia de violência imaterial ou oculta. São algumas das medidas viáveis.
Envelhecer com dignidade tem sido um slogan em voga. Um país é avaliado pela forma como trata as suas pessoas idosas. As estatísticas demonstram que presentemente por cada 100 jovens há 188 pessoas idosas, e a tendência é para esta proporção aumentar. Apesar de alguns benefícios de que a 3ª idade desfruta, há muito mais que se impõe realizar, como acima se demonstrou. Até lá a luta tem de continuar.
Lx. 30.11.2025 – Forum Lisboa
ASSINE A GAZETA DE PAÇOS DE FERREIRA
Opinião
28/12/2025
Opinião
28/12/2025
Opinião
27/12/2025
Opinião
27/12/2025