31/05/2024, 0:00 h
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OPINIÃO
Por Onofre Varela
OPINIÃO
Comecei a publicar a minha opinião de Ateu nas páginas da Gazeta, regularmente, há dez anos. Com mais seis anos anteriores, quando publicava “de vez em quando” textos abordando temas diversos, soma 16 anos de colaboração e cerca de 230 crónicas.
Quem me lê, apenas, neste jornal, deve imaginar que eu não tenho nada mais com que me preocupar e que nem sei tocar outro instrumento que não seja a flauta da crítica religiosa. Na verdade, enquanto jornalista-cartunista, sou um crítico da sociedade e de atitudes de personalidades públicas. É esse o meu papel e tento desempenhá-lo do melhor modo que sei e posso.
Paralelamente à profissão, tenho o meu raciocínio de cidadão comum, o qual me levou, perante o sentimento religioso, a “interrogar” em vez de “crer”. A interrogação é inquietante porque nunca é eliminada… as respostas encontradas geram outras interrogações… ao passo que a crença sossega pela “certeza” encontrada nos seus conceitos! Ao contrário do Religioso que encontra em Deus a resposta que procura para satisfazer todas as suas interrogações e se consola nelas, o Ateu interroga-se constantemente… é um eterno desconsolado!
Ninguém nasce ateu ou religioso, tal como não se nasce a saber falar, escrever, ler e contar. A Língua aprende-se em família… e a fé religiosa, também. Habitualmente o religioso é-o por tradição familiar, como extensão cultural da sociedade onde vive e que o modela. E isto tem um peso enorme na formação de cada um. O que aprendemos em criança acompanha-nos por toda a vida, quer para o bem, quer para o mal.
No meu caso particular, sou filho de mãe católica (de apelido Pereira… logo, Cristã Nova) e de pai nascido em 1912, ateu desde jovem, crescido na Primeira República numa aldeia Beirã (Espariz, Tábua) e que “bebeu” a ideologia anti-clericalista de então, a qual, provavelmente, o seu pai abraçaria como operário da panificação que era; e como se sabe, é comum os filhos copiarem os pais. Foi exactamente o que me aconteceu… por isso cresci Republicano e Ateu como era o meu pai.
Os meus pais nunca me obrigaram a frequentar a Igreja e ensinaram-me a ética laica comportamental no respeito pelos outros e pela Natureza, libertando-me da taça religiosa que “santifica” as mentes… mas que também as “envenena”. Libertado do “veneno-de-Deus-e-do-Diabo”, cresci separado do sentimento religioso-deísta e só tive o primeiro “embate” com a Religião aos vinte anos, em Angola.
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Aí, em ambiente de guerra, onde a morte rondava e podia calhar a qualquer um a todo o momento, admirei-me com a fé dos meus camaradas que rezavam para que não fossem atingidos pelas balas dos nacionalistas angolanos. De entre as minhas imensas dúvidas, havia esta certeza fatal: se uma bala viesse na minha direcção, não havia mão de Deus ou de santo que a pudesse desviar… e eu só viveria se não fosse atingido num órgão vital e se fosse socorrido a tempo. Parecia-me irreal qualquer outro pensamento distante deste.
Quando regressei da guerra obriguei-me a ler a Bíblia, o Corão, textos Budistas, História das Religiões, o Catecismo, Filósofos, Cientistas e Ensaístas, para satisfazer a minha curiosidade… e só 20 anos depois de encetar estas leituras, de falar com religiosos, ateus e agnósticos, e assistir a missas para perceber o que lá se passava, me considerei ateu… mas então já com a certeza de estar informado e de não me sentir um “ateu de aviário”.
Ao iniciar estas minhas crónicas na Gazeta, em favor do Ateísmo, animava-me a vontade de mostrar aos religiosos outro modo de sentir e pensar a Religião. Não sei se o consegui… mas penso que alertei consciências até então fechadas ao tema por “imperativo proibitório” da fé abraçada… mas isto é um pensamento meu… não tenho o retorno dos leitores e sei que os profundamente crentes não têm espaço mental para encararem opiniões diversas das suas. Dos textos publicados aqui (213… mais 120 no Semanário Alto Minho, totalizando 333), é minha intenção fazer uma selecção e talvez publicar em livro.
A partir de agora vou encarar outras motivações para escrever na Gazeta, baseando-me na Liberdade que os militares de Abril nos ofereceram há 50 anos (sem abandonar a defesa do Ateísmo, a cujo tema voltarei logo que sinta dever fazê-lo).
A quem é profundamente crente, quero dizer que continue a crer. Encontrará na fé ânimo suficiente para encarar os momentos menos bons da vida. Não se deve abandonar a crença sem se ter a certeza absoluta de o querer fazer em consciência, pois pode perder a identidade étnica e social… o que não é bom!
Despeço-me até à próxima crónica. Abraço-vos.
(O autor não obedece ao último Acordo Literário)
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