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Gazeta Paços de Ferreira

21/01/2024, 0:00 h

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“A GENTE VAI EMBORA” - (II)

Manuel Maia Opinião

OPINIÃO

Para não ser enfadonho vou terminar, resumindo este tema em dois pontos.

Por Manuel Maia

OPINIÃO

 

 

Ponto 1 - Na sequência das últimas palavras do amigo do “Grupo dos 4”, (vd foto, do meu último artº) amigo esse que, dois dias antes de morrer, se despediu de mim com as chocantes palavras: “Adeus Maia. Abraço com muita alegria…”

 

 

Palavras chocantes, enigmáticas, confusas, que me deixaram, naturalmente, baralhado. Ninguém se despede deste mundo com “alegria”. Isto, é o que pensa o comum dos mortais, como eu!

 

 

Acontece que o Dr. Jorge Morais não era um mortal comum. Digamos que se preparou para a morte. Isto faz-me lembrar palavras do Prof. Doutor Aloísio Lobo que encontrei um dia, já lá vão dias, anos, muitos anos, na paragem do autocarro, em frente à casa da Srª Margarida dos Fajões.

 

 

Íamos, ambos, a caminho do Porto. Parei o carro e dei-lhe boleia. Pelo caminho perguntei-lhe: - Sr. Prof. o que é para si Filosofia? E ele sem hesitar, respondeu: filosofia “é aprender a morrer”.

 

 

Claro que teve a honestidade de me dizer que este conceito remonta à idade dos Filósofos da Antiguidade: Platão, Sócrates, Aristóteles.

 

 

Na verdade, eis o que nos diz Sócrates: - “o acto de reflectir sobre a morte pode ser visto como uma das maneiras mais singulares de praticar a Filosofia, vendo esta como preparação para a morte”.

 

 

- O pensador alemão Arthur Schopenhauer considera a morte a “Musa da Filosofia”. E para Michel Montaigne, um dos mais importantes filósofos do renascimento (1533- 1592) num dos seus ensaios, diz: - “filosofar é aprender a morrer, para saber viver”.

 

 

- Li, em tempos, no Jornal Expresso, com o título “APRENDER A MORRER”, assinado por Dom José Tolentino de Mendonça o seguinte parágrafo: - “A morte na cultura contemporânea chega sempre de supetão, porque nos encontramos desprovidos de ferramentas interiores capazes de dialogar com ela”.

 

 

Ponto 2 – Depois das cerimónias fúnebres, do nosso amigo Dr. Jorge Morais, que decorreram na Igreja da Lapa, para espairecer ou distrair o meu espírito, decidi dar uma volta pelo Porto, Boavista. Dei por mim a admirar a estátua do centro da rotunda e a celebrar a vitória dos nossos aliados, ingleses, sobre os franceses, aquando das invasões napoleónicas.

 

 

Depois fui dar uma volta pelo Centro Comercial Brasília. Este, que já foi uma das “salas de visitas do Porto”, hoje, está uma miséria. Um caos. Frequentada por gente “assim, assim!”.

 

 

Depois dei um salto ao Mercado do Bom-sucesso. Entrei. Nunca lá tinha entrado depois das obras. Dei de caras com a secção dos restaurantes. Era para me sentar e almoçar. Era, mas não foi. Não havia lugar. Almocei em pé. Enguias grelhadas, com batata a murro, salada, uma taça de vinho branco maduro e doce de bolacha. Ouvi dar as 14h. Apanhei uma nesga, para me sentar e tomar uma “bica gorda” (café comprido).

 

 

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Sentei. E, uma vez mais, dei por mim a “sorrir por dentro”. É que, mesmo diante dos meus olhos, do outro lado da rua, situa-se o Edifício Península, onde, há muitos anos, o último piso deste Edifício fora ocupado pela organização e staff do Dalai Lama.

 

 

Esse mesmo! O representante do Budismo. O Homem que eu queria levar, em visita social, ao E.P. de Stª Cruz do Bispo. Nesse tempo, não hesitei e subi para formular o convite. – “Oh, que pena! Sua Santidade iria adorar. Chega na próxima semana. E, como compreende, já tem o programa todo preenchido!”.

 

 

E foi assim que, por um triz, não o levei ao E.P. Porque será que falo destas coisas com tantos pormenores? Já vão saber.

 

 

Estava eu então, posto em sossego, (é no meio da multidão que nos sentimos mais sós) a saborear o café e a distrair o meu espírito ou desviar meus pensamentos das exéquias fúnebres, quando, inconscientemente, encontrei-me a reler as últimas msgs trocadas com o Dr. J. Morais.

 

 

E esta cena pôs-me tão ausente ou alheado do ambiente que nem vi quem estava ao meu lado. Era o Dr. Paulo (…) – sei o nome completo dele, mas para o caso não interessa – Levantei-me. Cumprimentei-o. Saudámo-nos amistosamente …e, ó bronca das broncas!, de repente, não mais que de repente, não sabia onde estava, o que estava ali a fazer, como fui ali parar e, tão pouco conseguia dizer uma frase escorreita, tal era o meu estado de torpor!

 

 

Deitei a culpa ao vinho, mas, em boa verdade, tinha bebido apenas uma taça. Ele compreendeu, só compreende bem estas coisas quem está ligado à medicina e psicologia, tentou acalmar-me, dizendo que isso acontece a muito boa gente, mas, sinceramente, eu é que não fiquei nada tranquilo.

 

 

Então procurei saber a causa destas coisas. Chama-se, a estes lapsos de memória, anosognosia: é o esquecimento temporário, ou momentâneo, comum em pessoas acima dos 60 anos. Não confundir com Mal de Alzheimer.

 

 

Fiquei descansado ao saber que estava tudo bem com a minha memória e metade das pessoas com mais de 60 anos apresenta alguns sintomas devido à idade e não à doença. Os casos mais frequentes são: esquecer o nome de uma pessoa; ir a um quarto da casa e não lembrar o porquê ou para quê; não lembrar onde colocamos algumas coisas; perder tempo procurando onde deixamos os óculos ou as chaves.

 

 

Importante: aqueles que estão conscientes de serem pessoas que se esquecem, não tem nenhum problema sério de memória. Os que sofrem de uma doença de memória ou Alzheimer não estão cientes do que está acontecendo, ou seja, não estão conscientes de serem pessoas esquecidas, por natureza.

 

 

Caro amigo, Dr. Paulo. Estou bem, por isso me dei ao trabalho de descrever com tantos pormenores a situação do nosso encontro. Mas, a verdade é só uma, temos que “aprender a dialogar com a morte”, ou “Aprender a Morrer” porque um dia, devagarinho, pé ante pé A GENTE VAI EMBORA!

 

 

 

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